sábado, 5 de setembro de 2015

Lisboeta, mas com duas costela do Norte

É bem verdade que sou uma alfacinha de gema. Nascida e criada na capital. Mas os meus pais nasceram a uns largos quilómetros daqui, tal como os meus avós. Lá para o interior do Norte do país. 
Todos os anos, no "meu querido mês de Agosto" lá vamos nós, pelo menos duas semaninhas. É terra pequena onde toda a gente conhece toda a gente, menos eu que não sou de cá. Aldeia pacata onde não se precisa de telefone para falar com os vizinhos. É janela aberta e alma na voz. Come-se bem por aqui (bem demais até!). As gentes são generosas e oferecem um pouco de tudo o que tiverem. Legumes e fruta nunca hão de faltar a boa gente, mesmo que nenhum terreno tenha. É terra de enchidos e do fumeiro que fazem as delícias de muitos, mas não as minhas (o meu colesterol agradece). É terra de doçaria de colher, de figos pingo-mel acabadinhos de apanhar e de comer até ter de desapertar o botão das calças. É isso que hei-de reter sempre na memória: almoços e jantaradas à volta de uma mesa com comida que dava para mais 5 ou 6 pessoas. 
Mas nem tudo são maravilhas. O meio é pequeno e os boatos espalham-se aos 7 ventos. Quase não há rede nos telemóveis e internet é coisa rara mas, ainda assim, não há nada que não se saiba. 
Enfim, no meio de tudo isto aproveitam-se alguns vizinhos que se tornam mais do que família. Eu sei do que falo que, neste preciso momento, estou sentada à mesa da minha vizinha que, muito generosamente, me deixa cá estar para que possa utilizar a internet e, como se já não fizesse o suficiente, ainda me traz uma taça de abrunhos ou, como se diz por cá, caranguejos (que são umas ameixas mais pequenas e beeeem doces), lavadinhos, acabados de colher e muito mais do que alguma vez conseguiria devorar. Ela bem sabe o quanto aprecio esta iguaria. Tudo isto, e ainda nos convida para jantar. São estas pessoas que gosto de ter na minha vida. Aquelas que nos fazem gostar delas por serem exatamente como são, genuínas. 
Sim é bem verdade que gosto de passar por cá, especialmente se tiver companhia. No Verão há sempre alguma coisa para fazer, algum sítio para ir. Mas confesso que, no final da 2ª semana de cá estar, já começo a ficar farta. Isto é bom para aliviar a cabeça do stress mas se fico por cá muito tempo começo logo a ressacar da agitação da minha terra. Habituada numa cidade onde tenho tudo à mão, aqui no "fim do Mundo" como gosto de lhe chamar, depois de um par de semanas já começa a cair no exagero. E no Inverno pior. Sou um autêntica Gata Borralheira, como a minha mãe costuma dizer. Frio não é para mim e neve também a dispenso. Mas gosto de cheiro da madeira a arder, de meter lanha para a fogueira e se o Natal não for passado cá, já nem me sabe ao mesmo. Mas mais do que uma semana, já é pedir muito. 
É bom para pôr o sono em dia. Respirar um pouco do ar puro que nos resta. E não ouvir mais nada do que a voz das quadrilheiras à janela e dos grilos a cantar.
Sou uma menina da cidade mas às vezes falo alto, sou refilona e se for preciso vestir um fato de treino e ténis e me encher de terra também o faço (apesar de não perceber muito da agricultura). Como o meu pai costuma dizer: "Nunca tive medo de trabalhar". Gosto de batatas cozidas com azeite, cogumelos selvagens e sentar-me num ramo de uma cerejeira e primeiro encher o bucho e só depois o balde! Gosto das coisas simples (mas só de vez em quando). 

Se cada vez venho cá menos vezes? Sim.
Se cada vez venho cá menos tempo? Também.
Se algum dia vou deixar de cá vir? Talvez não. 

Sou uma lisboeta, mas com duas costelas do Norte.



Lembrem-se:
Keep your heels, head and standards high,
Vanessa S.

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